Gerardo Mello Mourão, o homem que me fez sentir vergonha de desconhecer o Brasil, dizia ter aprendido a versejar com os repentistas sertanejos. Deles, quem também dá testemunho é Suassuna, que não perde oportunidade de recitá-los, sempre de cor. Vi outro dia parte de um documentário sobre os mais célebres desses homens, dentre os quais se destacam, aparentemente, Pinto de Monteiro (famoso pelo engenho), Louro do Pajeú (reputado trocadilhista) e o curioso Zé Limeira, dito poeta do absurdo, já quase lendário cantador paraibano, cujos versos nos chegam graças exclusivamente à boa memória do povo que o ouviu. Desse último, encontrei algumas coisas na internet, as quais já estão entre as mais divertidas que tenho lido.
Um dia eu tava acordado,
No mais rancoroso sono,
Passou uma cobra azul
Falando num microfone,
E um mudo gritando em baixo:
— Vim buscar o meu abono!
Sou casado e bem casado,
Com quem, não digo com quem.
A muié ainda é viva,
Mas morreu, mora no Além.
Se um dia voltar à terra
Vai morar no pé da serra,
Não casa mais com ninguém.
Casemo no ano de quinze,
Na seca de vinte e três;
A muié era donzela,
Viúva de sete mês,
Mais não me alembro que tenha
Um dia ficado prenha,
Estado de gravidez.