A Península Ibérica foi sempre a periferia mais remota dos impérios aos quais pertenceu, um verdadeiro fim de mundo. E muito possivelmente nunca teria deixado de ser esse cu de Judas, mesmo que por alguns poucos séculos, não fosse a chegada de Abd al-Rahman às margens do Guadalquivir, por volta de 750, fugido de Damasco, onde viu a família — a casa dos Omíadas — não só perder o Império Islâmico como ser quase totalmente exterminada. Talvez nunca tivesse conhecido o gosto da proeminência intelectual, não fosse esse príncipe exilado, sem esperanças de reaver o trono agora ainda mais distante, levado que fora pelos Abássidas para Bagdá, ter decidido fazer daquelas ruínas romanas habitadas por bárbaros tão beatos quanto ignorantes a grande al-Andaluz, um dos centros culturais mais ricos de todo o medievo — pelo que diz María Rosa Menocal, em livro homônimo a este post, parece que já no século X havia só na biblioteca do califa de Córdoba, cidade que contava com quase uma centena delas, mais livros do que na Europa inteira.