29.9.14

Precursor

Há um pseudoepígrafo chamado Livro dos Segredos de Enoque, ou Segundo Livro de Enoque, ou ainda Enoque Eslavo — já que o único manuscrito que existia era em tradução para o eslavo, até que se acharam fragmentos dele em copta —, uma grande loucura apocalíptica que busca lançar luz sobre episódios canônicos mais enigmáticos, como por exemplo o envolvendo a impiedade dos nefilim, entre outros. Ninguém sabe ao certo quando foi escrito — século I é a data mais provável —, nem a língua — provavelmente em grego —, nem se de autoria judaica ou cristã — possivelmente judaica.

Mas isso tudo apenas pra dizer que fui folheá-lo outro dia e, de cara, duas coisas me chamaram a atenção:

— o livro começa no mesmíssimo e tão conhecido clima kafkiano, com Enoque acordando de uma incômoda noite de sono e enxergando ao pé da cama dois homens — anjos de aspecto terrível — que o comunicam a intimação divina para uma visita aos céus;

— e o mais surpreendente: Enoque acompanha os tais anjos indo de céu em céu: 1º céu, 2º céu, 3º céu, 4º céu, e assim por diante, até o 7º céu, se não me engano. E depois conta o que viu em cada círculo: anjos, arcanjos, o trono de Deus... Sim, sim. Exatamente a viagem que Dante, mil e duzentos anos depois, vai refazer.