Em sebos, não existe outro meio eficaz de não perder para sempre um livro que se quer, e que por qualquer motivo não se pode comprar, além de escondê-lo, o que mais frequentemente se consegue apenas com trocá-lo de lugar — eu mesmo acabo de esconder um livro sobre o caminho percorrido entre a alquimia e a química, isto é, entre o pensamento mágico e o científico, num canto pouco acessível reservado aos livros sobre animais domésticos. Se há uma lição que importa a um frequentador de sebos, é a de que não convém o desprezo por prateleira alguma, mesmo as menos promissoras, justamente porque quanto mais mal-frequentada uma estante, mais ideal ela é como esconderijo — sem contar que nada impede a um livreiro desavisado colocar um volume do José Guilherme Merquior intitulado O elixir do Apocalipse na seção de escatologia bíblica. E é por isso que de tempos em tempos cada qual deve passar em revista inclusive os livros de gurus ocidentais com apelidos indianos e os romances psicografados pela Zíbia Gasparetto, entre os quais não faz nem quinze dias encontrei escamoteado o Pele negra, máscaras brancas do grande Franz Fanon.