1.4.16

O Livro de Jó talvez marque o momento exato em que surge, no pensamento judaico, a crise que o conduz à necessidade de uma perspectiva escatológica. Até então, o que eles tinham era a vida, regulada pela Lei em cada um de seus aspectos, mesmo mais corriqueiros, e ao longo de todas as suas fases, do berço ao túmulo. Mesmo o paraíso com que contavam era de natureza geográfica. Até que surge, para a sensibilidade de alguns, o escandaloso descompasso entre justiça pessoal e bem-aventurança: os justos eventualmente sofrem; os ímpios na quase totalidade dão-se bem. Ora, Deus onde está, que não recompensa os homens segundo a vida que vivem? Mais: um Deus que assim o faz pode ainda ser considerado justo? Os responsáveis pela tradição apressam-se com os panos quentes, mas em vão. Mesmo a submissão vai agora cheia de uma perplexidade inevitável, dada a carteirada de Deus: “Onde vocês estavam quando Eu criei o mundo?” Para o impasse, uma solução possível: a ressurreição dos justos para a vida, a dos ímpios para a morte. O céu. O inferno.