16.12.16

Alquimia

Na base do pensamento alquímico estaria a crença de que todos os minérios não passam de etapas interrompidas no longo e demorado processo de chegarem a ser ouro; a crença de que os vários tipos de metais devem a existência ao fato de que, a determinada altura, são impedidos pela extração de alcançarem sua destinação final. O trabalho do alquimista, aliás, seria justamente o de retomar esse processo e, por outras vias que não as naturais, abreviar o arrastado tempo geológico. Impossível tomar conhecimento dessa ideia de finalidade progressiva da natureza sem pensar na forma teleológica de pensamento evolucionista que decorre do providencialismo cristão, uma das ideologias mais fundamentais do Ocidente. Trata-se do mesmo princípio, apenas descolado a outro campo: determinada forma biológica, ou cultural, ou social, ou religiosa, ou estética, ou histórica como ouro, isto é, como ápice em relação à qual todas as outras formas são resquícios de estágios a serem superados. Daí que, se isso faz sentido, toda missão civilizatória deseja reproduzir a tarefa alquímica. Assim como o alquimista ambicionava vencer a defasagem da matéria por meio da ação sobre ela, promovendo pelo próprio esforço a eliminação de um caminho progressivo demasiado extenso, o civilizado precisa fazer o mesmo com o mundo. Transmutar o ferro em ouro, o bárbaro em gente, a barbárie em civilização. Guiar os homens ao estado de perfeição aurífera do qual se encontram privados. O alquimista, “salvador fraterno da natureza”; o civilizado, salvador fraterno da humanidade.