9.5.20

Reforma religiosa e reforma linguística

Foi sempre tão estreita a relação entre as religiões e a fixidez das línguas (sempre ouvi dizer que foi o zelo religioso dos hindus com suas escrituras sagradas que deu origem à gramática): as antigas religiões indianas e o sânscrito, o judaísmo e o hebraico, o cristianismo e o latim... De tal modo que nunca pôde haver reforma religiosa que não levasse também a uma revalorização linguística: os sermões de Buda sacralizam o dialeto indiano mais baixo; a mensagem de Cristo é toda ela divulgada em grego comum; os pais da igreja escrevem, e portanto elevam a outro nível, o sermo humilis dos romanos; as traduções do Lutero camponês formatam o alemão moderno... Talvez não sejam as novas crenças religiosas que, popularizadas, subvertem a escala de valores do universo linguístico a que pertencem; talvez, ao contrário, seja a ascensão das formas baixas de dizer que, fazendo caminho pela pregação desses reformadores, confrontem as crenças estabelecidas com as crenças novas que carregam em si.