NOTURNO
Frescor dos vidros quando se apoia a testa na janela. Luzes tresnoitadas que ao serem apagadas nos deixam ainda mais sós. Teia de aranha que os arames tecem sobre os terraços. Trote oco dos pangarés que passam e nos emocionam sem razão.
O que nos faz recordar o uivo dos gatos no céu, e qual será a intenção dos papéis que se arrastam pelos pátios vazios?
Hora em que os velhos móveis aproveitam para sacar as mentiras, e em que os encanamentos têm seus gritos estrangulados, como se asfixiassem dentro das paredes.
Às vezes se pensa, quando se vira a chave da eletricidade, no espanto que as sombras sentirão, e gostaríamos de avisar a elas, para que tivessem tempo de encolher-se nos cantos. E às vezes as cruzes dos postes telefônicos sobre os terraços têm algo de sinistro, e gostaríamos de roçar-nos às paredes como um gato ou um ladrão.
Noites nas quais desejaríamos que nos passassem a mão pelas costas, e nas quais subitamente se compreende que não há ternura comparável à de acariciar algo que dorme.
Silêncio! – grilo afônico que nos entra pelo ouvido. Canto das torneiras mal fechadas! – único grilo que convém à cidade.
Buenos Aires, novembro, 1921.