29.5.15

O trono, a coroa

Sem ter o que fazer, observou o carro de lixo e logo tentou empurrá-lo, acabando apoiado nos varais. A montanha de lixo tremeu, deixando escorregar pelos lados avalanches de cascas, verdes e vermelhas. Descobrindo afinal uma utilidade, Fraji pôs o pé direito sobre uma das rodas, segurou-se na grade e subiu. Hesitante, enfiou suas perninhas no lixo podre e retesou-se. Olhou em torno de si: via-se mais alto que todos nós, mais alto que o mundo inteiro, sobre um trono multicor de papéis amarrotados, cascas de ovo e legumes. Desassossegadas, as moscas verdes e douradas aureolavam-no de uma coroa movediça, que brilhava ao sol. Então, levantou os braços ao céu e gritou, convencido como um galo: — Eu sou o rei! Eu sou o rei!

— Albert Memmi, A estátua de sal.