6.6.15

Confessio

A minha têmpera tem na família um ilustre precursor, o irmão mais velho do meu pai, que por sua vez está entre os mais novos. Mesmo com quase nenhuma convivência (até hoje foram pouquíssimos os encontros, ainda mais escassas as conversas), tenho com ele pelo menos quatro grandes similaridades: tanto ele quanto eu fomos batistas durante a juventude; tanto ele quanto eu fomos seminaristas de nossas igrejas e nos dedicamos incompletamente ao estudo da Teologia, que depois ele trocou pelo Direito e eu pela Literatura; tanto ele quanto eu quase nunca estamos nas reuniões de família, acho que ele bem menos do que eu, que de vez em quando ainda dou as caras no Natal, ele nem isso; tanto ele quanto eu nos dedicamos aos livros, sobretudo aos usados, muito embora o interesse de meu tio seja um bocado mais desordenado que o meu: os meus poucos livros cabem num mísero cômodo, os dele demandam não sei quantos apartamentos. E tudo isso — percebo agora — me salva. Hoje minha madrinha — a pessoa em cuja casa eu, quando criança, tomava café todas as manhãs, e ao lado de quem lançava para um batalhão de pombos as bolinhas que fazíamos à mesa com o miolo que ela e meu padrinho me habituaram a retirar do pão, e que hoje em dia eu quase não visito — esteve aqui em casa e, na hora de se despedir, me chamou sorrindo pelo nome do irmão mais velho, como que me desculpando pelas negligências todas.