25.4.20

Também eu não sabia muitas coisas

Como todas as crianças, também eu não sabia muitas coisas. Porém, olhando para trás, o que me complicou mais do que o necessário foi ter perdido o hábito de perguntar. Tenho muito nítida a memória do embaraço de minha mãe durante a conversa típica sobre Deus — mas se Deus é o criador de tudo, então quem é o criador de Deus? — e, por timidez, a partir daí não perguntei mais, me ocupando sozinho com a formulação de hipóteses, naturalmente as mais absurdas. Deve ter sido essa a causa de, por muito tempo no começo de minha vida, eu não saber que o dia do aniversário não era um dia escolhido arbitrariamente pelos pais, mas o dia fatídico do nascimento. Então durante muito tempo o dia do aniversário dos outros foi para mim um grande mistério: por que comemorar o aniversário nesse dia e não em qualquer outro? O que leva um pai a escolher determinado dia, dentre tantos? Que tarefa desafiadora devia ser escolher o dia do aniversário de um filho. Ainda mais uma escolha assim tão definitiva, já que era comemorado no mesmo dia todos os anos. Do aniversário dos outros era natural que eu passasse ao meu próprio aniversário, que se dava numa data bem pouco significativa, longe de todos os grandes dias cívicos e religiosos do ano. A suspeita foi de que talvez meus pais não gostassem tanto assim de mim para escolherem um dia que fosse importante para outras muitas pessoas, como deviam ser importantes os filhos que faziam aniversário junto a feriados nacionais. E fui remoendo essa mágoa de meus pais até que um dia, já não lembro como, descobri. Então o dia do aniversário era apenas outro nome para o dia do nascimento? Então o que as pessoas comemoram no dia do aniversário é na verdade o dia em que nasceram? Coisa espantosa. Tudo passou então a fazer mais e menos sentido. Fazia todo sentido que não fosse assim uma escolha arbitrária dos pais. Mas comemorar o próprio nascimento? Ainda não conhecia Jó, mas então já me pareceu muito esquisito.