25.4.20

Contos de Amor e Morte, Arthur Schnitlzler





















A partir da leitura deste livro, fica impossível reconhecer a legitimidade de qualquer lista de maiores contistas que não comece por Arthur Schnitzler, nem qualquer antologia de melhores contos já escritos que não tenha os contos “A profecia” e “O diário de Redegonda”. O contraste com Tchekhov (curiosamente, ambos médicos) é enorme — a vagueza e a abertura do russo, o cálculo e a precisão do austríaco; o olhar cheio de compreensão do primeiro para com as pessoas comuns, a perspectiva de condes e barões e burgueses tratada com ironia pelo segundo —, a não ser em uma coisa: a perfeição absoluta no efeito pretendido por cada qual. Os contos de Schnitzler são engrenagens perfeitas, sem uma frase a mais, uma palavra fora de lugar, um fio solto, tudo minuciosamente arranjado. Perto de um conto de Schnitzler, até a prosa de um Flaubert parece imprecisa. Contribui muito com isso a qualidade da tradução de George Bernard Sperber, num português excelente, e da edição, que não deixou escapar uma vírgula, uma gralha. Também chama a atenção o interesse cético de Schnitlzer pelos fenômenos sobrenaturais, pelo ocultismo tão em voga na Viena do seu tempo. E, por falar no ocultismo da Viena de seu tempo, as pessoas que vão até a nova série da Netflix em busca de Freud fiquem sabendo que o que a série oferece é o universo de Schnitzler: a série é uma novela menos sutil de Schnitzler com Freud como protagonista.