8.6.21

O contraste


Uma única página de Chuang Tzu é o suficiente para fazer da nada desprezível sabedoria confuciana uma pocinha d’água. Como ele mesmo sugere, Chuang Tzu é um peixe-pássaro cujas asas cobrem todo o céu, enquanto os demais o recriminam durante seus voos de galinha. Agora sei que a maneira correta de ler Chuang Tzu começa por lê-lo só após a leitura das prescrições receituárias de Confúcio e de Mêncio, porque apreende-se muito do que pretendiam os mestres taoístas já só pelo contraste. Lida após toda a sobriedade, a razoabilidade de Confúcio e de Mêncio — graves conselheiros governamentais, defensores dedicados da burocracia ritual —, uma página de Chuang Tzu vira uma visão psicodélica, um poema surrealista, um desfile carnavalesco.

2.6.21

O caminho do meio

De Confúcio, diz-se que ele até pescava, mas apenas um peixe por vez, de vara e anzol; jamais pescava com rede, porque se recusava a matar peixes aos montes. Diz-se também que até caçava pássaros com arco e flecha, mas fazia questão de preservar os pássaros que cantavam. Chama a atenção como isso, que os antigos conseguiam enxergar como demonstração de piedade e moderação, soa hoje para nós como incoerência. Os antigos chineses viam diferença entre matar esse animal e não aquele, uma quantidade de animais e não outra. Já a pergunta que nós hoje mais vemos ser feita é: se não se alimenta deste animal, por que se alimenta daquele? Ou: se é errado matar mil, por que matar um? Entre esse tudo ou nada, o velho e abandonado caminho do meio.