28.12.11

Renard

Tomei notícia dos diários de Jules Renard (escritos entre 1887 e 1910) lendo os de André Gide, que a certa altura os menciona e rapidamente os comenta, numa admiração um tanto reticente, se bem me lembro. Para meu contentamento, descobri que neles Renard se dedica a observações psicológicas e literárias tão agudas quanto breves. Quando muito, se prolonga em diálogos dos quais foi testemunha, ainda eles curtos, protagonizados ora por amigos literatos, ora por anônimos. Dessa leitura incompleta e aleatória, fui separando e traduzindo o pouco que segue. 
Sou um escritor cujo gosto pela perfeição impede de ser grande.
De literatura francesa, não li mais que trechos escolhidos. Gostaria apenas de os ter escolhido eu mesmo. 
Recuso-me a saber o que pode pensar dos homens de talento o homem que não o tem.
Pouco a pouco vou renunciando a todas as coisas que não pude ter. 
Uma vez tomada a resolução, continuo indeciso. 
Se os homens tivessem o poder de completar a natureza, à serpente acrescentariam espinhos. 
É assim tão certo que se nasce para viver? 
Chamam “audacioso” o que deveriam chamar, simplesmente, “obsceno”. 
Lamartine imagina cinco minutos e escreve uma hora. A arte é o contrário disso. 
Ainda é feliz o homem que pode dizer: já fui feliz. 
A ocupação de um escritor é aprender a escrever. 
O arco de minha frase está sempre tensionado. 
Cada uma de nossas obras deve ser uma crise, quase uma revolução. 
Nosso melhor é incomunicável. 
O gosto da morte não se dá sem o desgosto de tudo o mais. 
Como homem, aceitar todos os deveres; como escritor, outorgar a si todos os direitos, inclusive o de zombar dos deveres. 
Quanto mais se lê, menos se imita. 
A recompensa dos grandes homens é, muito depois de sua morte, não estarmos certos de que morreram.

Como eu poderia ser a um só tempo anarquista e satisfeito? 
O fatigante suplício de, durante uma hora, dizer não a um senhor que gostaria de fazê-lo dizer sim.
Ela deixou escapar um segredo que não tinha. 
Francamente, amigos Barrés, Paul Adam, Bernard Lazare etc., por que aceitam a opinião da maioria em política se não a admitem nas artes?