31.8.12

Blandícia

Parece até que gostamos de nos julgar numa sociedade violenta. Do contrário, por que nos diríamos em uma que, pesadas as coisas, é branda em demasia, matando até de menos? Não é difícil perceber que a quantidade de brasileiros rebolando cretinice por sobre a terra é incomensuravelmente maior que a de brasileiros mortos, por exemplo, com um tiro na cara, — o que só por si põe em xeque tal alegação. Eu poderia apelar para um número infinito de circunstâncias — nós conhecemos bem a fauna que habita as filas, os transportes públicos, os locais de trabalho, as cátedras universitárias —, mas opto pela mais ampla. Para onde olhamos, vemos ruas pavimentadas, e nessas ruas, carros, e nesses carros, ao volante, brasileiros. Pois bem. Conquanto chamem violento a esse nosso trânsito, eu lhes asseguro que não há uma só vez que eu saia de casa sem testemunhar algum motorista sair ileso depois de muito implorar por um tiro. Hoje mesmo vi um sujeito descer do carro e partir com impropérios em direção a outro, logo atrás. De imediato me ocorreu: menos um. E, todavia, nada. Cansado de xingar, sem o tão merecido óbito, virou-se, retornou ao carro e foi-se.