29.1.13

“Cova do tempo”

[...]

Quem ordena, julga e pune?
Quem é culpado e inocente?
Na mesma cova do tempo
cai o castigo e o perdão.
Morre a tinta das sentenças
e o sangue dos enforcados...
— liras, espadas e cruzes
pura cinza agora são.
Na mesma cova, as palavras,
o secreto pensamento,
as coroas e os machados,
mentira e verdade estão.

Aqui, além, pelo mundo,
ossos, nomes, letras, poeiras...
Onde, os rostos? onde, as almas?
Nem os herdeiros recordam
rastro nenhum pelo chão.

[...]

— Cecília Meireles, em “Fala inicial”, de Romanceiro da Inconfidência, 1953.