25.7.21

Elizabeth Costello, de J.M. Coetzze


 

 

 

 

 

 

 

 

 


A grande vocação do romance moderno é a paródia: Cervantes parodia o romance de cavalaria; Defoe e Swift, os relatos de viagem marítima; Joyce, a odisseia de Ulisses; e assim por diante. Nesse livro, Coetzee parodia as palestras acadêmicas, cada capítulo girando em torno a uma conferência dedicada a algum tema fundamental ao trabalho do romancista, de maneira que a leitura do livro equivale a um pequeno curso de teoria literária. Já tudo que diz a romancista Elizabeth Costello é em defesa da velha pretensão universalista dos escritores ocidentais de poderem e deverem se identificar com tudo e todos a fim de poderem e deverem falar em nome de tudo e todos, e isso por meio da onipotência da imaginação que vence todas as barreiras (sexuais, raciais, de classe e até mesmo de espécie, donde o vegetarianismo da escritora). Segundo Elizabeth Costello, essa identificação é tão poderosa, que os autores devem apenas evitar figuras e episódios muito atrozes, uma vez que é impossível imaginar um monstro sem tornar-se um monstro. No penúltimo capítulo do livro, Coetzee deixa de parodiar conferências acadêmicas para parodiar um conto de Kafka no qual se cobra, da maneira tipicamente mais absurda, de um escritor o seu credo. E o escritor do conto, a própria Elizabeth Costello, nega em vão que um escritor possa ter um credo, já que precisa estar disponível a todas as crenças possíveis, uma vez que não sabe de antemão quais serão as que seus personagens terão. Quer dizer, a velha tradição literária europeia (da qual Coetzee é herdeiro), que começa com Homero (grego) falando por gregos e troianos, Heródoto (grego) falando por todos os povos da terra, Ésquilo (grego) falando pelos persas, aqui defendida (e nisso reside o grande truque) por uma romancista mulher, ainda por cima em condição colonial (Costello é australiana).

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